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sábado, 26 de janeiro de 2008

Constituição: ainda cidadã?


País precisa concretizar e não reformar Constituição, diz jurista

Brasília, 24/01/2008 - “O Brasil precisa basicamente não é de reformas de textos constitucionais, mas sim de concretização constitucional, pois já passamos de meia centena de emendas constitucionais, mas os problemas básicos do Estado brasileiro persistem: corrupção sistêmica do direito e da política contrariando as exigências do Estado de direito; ampla exclusão social contrariando a realização generalizada dos direitos fundamentais”. As afirmações foram feitas hoje pelo jurista Marcelo Neves, um dos mais renomados especialistas em Direito constitucional no País, ao rechaçar qualquer proposta de Constituinte exclusiva hoje no Brasil, inclusive no que se refere a propostas de utilização desse instrumento para uma reforma do sistema político. “O que se reclama hoje no Brasil, em relação aos seus políticos e às suas organizações políticas, é, repito, a concretização consistente da Constituição”, sustentou.

A seguir, as opiniões do constitucionalista Marcelo Neves a respeito da proposta de convocação de uma Constituinte exclusiva para reforma do sistema político:

“Em primeiro lugar, o que o Brasil precisa basicamente não é de reformas de textos constitucionais, mas sim de concretização constitucional. Já passamos de meia centena de emendas constitucionais, mas os problemas básicos do Estado brasileiro persistem: corrupção sistêmica do direito e da política contrariando as exigências do Estado de direito; ampla exclusão social contrariando a realização generalizada dos direitos fundamentais. De certa maneira, essa compulsão reformista em relação ao texto constitucional é mais um episódio de constitucionalização simbólica, ou seja, trata-se de uma reconstitucionalização simbólica permanente. Constitui, antes, álibi para fracassos, não contribuindo para a solução dos problemas cruciais do Estado brasileiro. E reforma do Estado não se confunde com reforma de textos constitucionais, dependendo, no caso brasileiro, de reorientação das expectativas e dos comportamentos de agentes públicos e privados no sentido da concretização constitucional.

Em segundo lugar, embora sejam exigíveis certas mutações jurídicas referentes ao nosso sistema político, em muitos casos é suficiente a alteração da legislação ordinária. E quando são necessárias reformas constitucionais, parece-me mais oportuno para o desenvolvimento do nosso constitucionalismo que essas reformas sejam realizadas pelo procedimento constitucional de Emenda à Constituição. Uma "constituinte" exclusiva para a reforma política, além de não ser necessária, contribui para a desconfiança pública na Constituição como horizonte da atividade política e jurídica. Só teria sentido um Constituinte, no presente, se ela surgisse de amplos movimentos sociais contrários ao modelo textual de constituição em vigor. Mas não é o caso. O que se reclama hoje no Brasil, em relação aos seus políticos e às suas organizações políticas, é, repito, a concretização consistente da Constituição. Eventualmente, pode ser necessária uma reforma legislativa ou Emenda constitucional para o aperfeiçoamento do sistema político, mas o cerne da questão reside na superação de duas característica dominantes do Estado brasileiro: a cultura política da ilegalidade e a prática política contrária ao modelo constitucional.

Em suma: o que se impõe, antes de tudo, é que tomemos nossa Constituição a sério”.

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